domingo, 27 de abril de 2014

QUANDO SILÊNCIO É AMOR

Na da travessia de grandes dores, sobretudo nas perdas, há sempre um momento em que a necessidade é ficar só. É como numa enxaqueca, quando o remédio é fechar a cortina e hibernar na dor, até ela ir. E a presença de amigos, por amorosos e solidários que eles sejam, incomoda como buzinas ruidosas em noite de silêncio. Mesmo que sejam sinfonias. Amigos sensíveis sentem isto. Eles não se retiram. Ficam a certa distância, em respeitoso silêncio. É como se dissessem: "quando puder abrir a janela, eu estou aqui".

MEU AMOR, ASSIM...



Meu amor fala pouco.
É quieto, quase silente.
Às vezes diz em monossílabos,
Ou apenas em olhares e sentidos.
Só o sente,
Quem tem mais pele e menos ouvido.
Ele está aqui.
Verdadeiro. Forte. Sereno.
Às vezes não serve, nem sacia,
A quem deseja amor com açúcar demais.
Porque já de si mesmo é sabor.
Meu amor nutre, não mata a fome.
A fome de amor
É de quem tem fome de si, não de mim.
Meu amor não tem nome.
Não se dá título disso ou daquilo,
Nem se oferece. Abre as portas.
Meu amor não faz bravata.
Abraça quando sente.
E se mostra quente,
Quando não está frio.
É amor quando é!
Diz pouco em verbo.
Mas diz sempre.
Em atos e gestos.
E em versos,
À vezes...

(Ray do Vale)
Dez 2013 / Jan 2014
www.ray-vale.blogspot.com

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Entender ou sentir?


Num processo autotransformador, melhor sentir do que entender. Às vezes ficamos procurando elaborar intelectualmente, porque sinto isto, porque faço aquilo, porque explodo, porque gasto muito, porque agrido, porque não mudo aquele padrão repetitivo que me incomoda e frustra tanto? Funciona mais reconhecer, permitir-se sentir, respirar o propósito de mudar. Ir exercitando o movimento de mudança pouco a pouco, compassivamente, é o próximo passo. Buscar ajuda é outro.
Se apenas entender resolvesse, não existiriam cidadãs e cidadãos com gordurinhas a mais no corpo. Não há gordinha ou gordinho minimamente esclarecido que não entenda TUDO de dietas saudáveis.
Mas há comandos muito mais profundos e encobertos que tanto nos empurram para a atitude ou emoção que não queremos, como para o pedaço de torta que nos deixa culpados.
As terapias vivenciais e corporais são muito eficazes nesses processos, porque não passam pelo controle racional. Elas nos levam a acessar emoções, sentimentos e imagens arcaicas que uma vez trazidas à consciência, tem seu poder compulsivo reduzido.
Ray Do Vale

quarta-feira, 16 de abril de 2014

A CRIANÇA EM NÓS – 1ª. parte


Todos nós, em determinados momentos de nossa vida, agimos e reagimos a partir de uma consciência infantil. Não que sejamos infantis no sentido comum do termo. Mas há, em todas as pessoas, sem exceção, aspectos da consciência que ficaram congelados em memórias da infância. Uma determinada experiência da criança, na relação com os adultos significativos, gerou um choque e a energia vital entrou em colapso, naquele momento. É como uma foto. Não! Não é como uma foto! É como um “retrato”, daqueles antigos, que ficavam na parede a vida toda. Pois bem: esse retrato continuará “enfeitando” a sala da vida, comandando as ações e sentimentos do adulto, de forma inconsciente. São as imagens. Marcam como ferro em brasa. Delas brotam as crenças, que perduram e são poderosas em seus efeitos. Se não forem reconhecidas e trabalhadas podem fazer estragos. Por exemplo, uma menina que viu sua mãe submetida à violência do pai, pode generalizar essa experiência de diversas maneiras: 1) todos os homens são violentos; 2) todas as mulheres bondosas (como minha mãe) sofrem violência; 3) se eu me relacionar com os homens, sofrerei violência; portanto, melhor fugir deles; 4) melhor maltratá-los, antes que me maltratem; 5) vingarei minha mãe, maltratando os homens; 5) nunca serei igual à minha mãe! Comigo vai ser diferente! 6) vou atrair para minha vida homens violentos; assim eu confirmo que todos eles são mesmo maus. E por aí a fora. São apenas exemplos.
Com os homens não é diferente: uma experiência negativa com a mãe, por exemplo, pode contaminar sua relação com todas as mulheres na vida adulta. Este são apenas os exemplos mais eloquentes. Nossa vida é marcada por eventos comuns, corriqueiros, onde quase sempre estão presentes emoções, sentimentos e vozes infantis. Muitas de nossas reações tem essa origem. Em muitas, ocasiões estamos reagindo no presente a um evento do passado. Os sentimentos infantis represados emergem vigorosos e sem controle no momento inoportuno e com a pessoa errada.
A boa notícia é: o que a alma deseja, reeditando as velhas histórias é encontrar a cura para as velhas feridas. Mesmo que faça isto de forma atrapalhada e tosca.
Ray do Vale
www.ray-vale.blogspot.com

sábado, 12 de abril de 2014

A CARA DO MEDO



A CARA DO MEDO
Não é negando o medo que se vence o medo. Nem é sufocando a tristeza ou a raiva que você vai ultrapassar saudavelmente essas emoções. Jogar para o subterrâneo, fingir que está tudo bem é um caminho falso. Mais tarde esta energia sobe à tona em circunstâncias fora de controle, que nada tem a ver com o fato original. Ou a pessoa adoece e drena pelo corpo, ou desaba em cima de alguém, sem saber como nem por que. Olhar de frente, dialogar com o sentimento presente é sempre o melhor caminho.
O que mais ajuda um estudante às vésperas do vestibular, por exemplo, e ajudá-lo a olhar na cara do medo: medo do “concorrente”, medo do medo , medo de desapontar os pais; e até medo de não dar dividendos comerciais ao curso onde estuda. Com essa permissão ele rende muito mais e encara com mais calma o momento decisivo. O contato verdadeiro com a realidade interna sempre oferece mais recursos do que fugir dela. Não se pode domar um bicho que não se vê.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

MURO

MURO
Quando olho a paisagem do mundo,
Vejo homens e mulheres caminhando separados,
Quais crianças perdidas.
Um quer ao outro, e no entanto,
Guerreiam na escuridão,
sob comandos remotos -
nascidos de que porões ?
Herança cega de vozes anciãs
Vomitando pesadelos.
Sentimentos emprestados,
Lealdades a sofridos amores,
Enterrados em que passado?
As mãos que anseiam por unir-se, seguram punhais alheios.
Das bocas ávidas por beijos e afagos,
Brotam as duras estocadas do verbo envenenado,
Carpindo ódios não se sabe de quem.
Eu vi homens e mulheres - nem tão diferentes -
chorando sobre travesseiros ensopados de medo.
Medo de chorar no colo da leveza;
derreter-se no ombro da inocência;
depor as armas - e perder o poder...
Que poder?

Ray do Vale
www.ray-vale.blogspot.com

O PRECONCEITO NOSSO DE CADA DIA

PRECONCEITO é uma palavra horrível, abominável para a qual geralmente olhamos com olhar de "cruz credo","deus me livre" e "ora veja!" Como se estivéssemos muito longe dessa coisa feia. Será ?
Mas o que é mesmo preconceito?
Pré - antes. É um conceito antecipado, feito com precipitação, contaminado com ideias e impressões pessoais. Alguém enquadra uma questão, uma pessoa, um fato, uma ideia, no seu olhar limitado, errôneo, baseado na ausência de conhecimento sobre a questão. É um julgamento e uma condenação “a priori”.
Nós, seres humanos, guardamos muitas incoerências. Estamos tão distanciados nos nosso processos internos que não nos damos conta das cascas de banana que colocamos sob nossos próprios passos. E saímos pela vida cunhando rótulos que só servem para todos os outros, menos para nós. Quem de nós não tem preconceito?
Por falar nisto, você conhece alguém que assume que assiste novela? Ou que vê Bigbrother? Pouquíssima gente, né? A se julgar pela escassa estatística dos que revelam o seu pecado, a Globo já teria aberto falência. Por que será que as pessoas escondem que veem? Preconceito, medo do preconceito, medo de serem julgadas, rotuladas? Você não pode ver novela por distração ou prazer. Se vê, é porque é burro e desinformado.
Hoje em dia todos estão com as barbas de molho em relação a discriminar negros e homossexuais. Moleza fingir . Mas alguém se dá conta dos outros preconceitos “menores” , socialmente aceitos? E os gordos, e os velhos? "Você se veste mal! Parece uma velha!" E os índios? "Vai fazer programa de índio" E tantas coisas mais! Mora no subúrbio (farofeiro e brega) ; usa tatuagem (drogado); pobre (não sabe se portar em ambientes finos); gosta de se vestir bem (patricinha); é malhado (burro); o pai tem posses ( riquinho besta) e por aí afora. Talvez devamos olhar na cara do preconceito nosso de cada dia, sem preconceito. Se você percebe o seu - e muda, quem sabe o mundo muda?